O celular de Edimilson da Silva, conhecido como Macalé, foi manipulado após sua morte, segundo relatório da Polícia Federal. Apontado como o responsável por intermediar a contratação de Ronnie Lessa para executar a vereadora Marielle Franco, Macalé foi assassinado em 6 de novembro de 2021 na Zona Oeste do Rio de Janeiro.
As informações constam no inquérito que apura os assassinatos de Marielle e do motorista Anderson Gomes, em tramitação no Supremo Tribunal Federal. A PF identificou que, após a morte de Macalé, seu aparelho celular foi utilizado para inserir contatos e realizar ligações. O crime ocorreu pouco depois do meio-dia, quando o ex-policial militar caminhava com três gaiolas de passarinhos pela Avenida Santa Cruz.
O celular foi apreendido ainda no dia da execução, mas só foi encaminhado para perícia em 25 de julho de 2023, quase dois anos depois. O envio do aparelho ao setor técnico da PF ocorreu um dia após a prisão do ex-bombeiro Maxwell Simões Corrêa, o Suel.
A perícia constatou que o telefone chegou a ter outros dois chips antes do atual, o que sugere que Macalé pode ter trocado de aparelho ou de número com frequência. Foram detectadas alterações nos dados, algumas atribuídas ao funcionamento automático do sistema, mas outras ligadas ao uso ativo do dispositivo.
Quatro contatos foram criados no telefone depois do horário estimado da morte: Chuck, Marcelo Pres. TNLD, Sheila e Fábio Cabeça. Às 13h01, duas ligações foram feitas para Chuck, seguidas por uma mensagem de localização. A posição do celular era próxima ao local do crime. Apesar do horário, o histórico mostra que Chuck e Macalé já haviam se comunicado antes.
Outro contato, Marcelo Pres. TNLD, telefonou para o número de Macalé às 13h16, mas não foi atendido. O registro da ligação foi apagado. Ambos faziam parte de um grupo de motoqueiros conhecido como Tonelada, e Macalé era entusiasta do motociclismo — chegou a comprar uma Harley Davidson de quase R$ 120 mil em 2020.
Às 13h16min31s, o nome Sheila foi adicionado à agenda do celular. Logo em seguida, o aparelho registrou uma série de chamadas não atendidas dela, cujos registros também foram excluídos. Já o contato Fábio Cabeça foi inserido às 14h52, com registros de chamadas, mas sem conversas anteriores identificadas.
A PF também descobriu que Macalé trocava de número de telefone a cada seis meses. Em mensagens recuperadas, ele se identifica como John Macalister. Em conversa com um contato salvo como DEL, escreveu: “Troco mesmo, de seis em seis meses eu troco, sou foda. Não gosto de ficar com número muito tempo não”.
Em outro diálogo, Macalé relata seu passado violento, mencionando que “matava mesmo” e afirmando que já causou muito mal em áreas dominadas pelo Comando Vermelho. Segundo a PF, ele não se referia à atuação como policial, mas sim ao envolvimento com milícias, em especial à proximidade com Ronnie Lessa.
Em uma dessas conversas, ele diz: “A gente matava mesmo, vagabundo pra caralho aê, conhecido”. Em outra troca de mensagens, reage a provocações sobre segurança em diferentes regiões do Rio: “Lá [Santa Cruz] não tem perigo nenhum. Porra, vai lá pra Angra, lá pro Comando Vermelho. Eu já fiz muito mal a eles”.
O perfil virtual de Macalé, sob o nome John Macalister, também era usado para conversar sobre passarinhos, sua paixão declarada. Ele participava de grupos de compra e venda de aves e de campeonatos do ramo. Segundo a PF, essa afinidade teria aproximado Macalé do deputado federal Chiquinho Brazão, conhecido por homenagear passarinheiros no Congresso.
De acordo com a investigação e a delação de Ronnie Lessa, os irmãos Chiquinho e Domingos Brazão teriam feito contato com o matador confesso por meio de Macalé. Ambos negam envolvimento com o crime e afirmam desconhecer qualquer relação com Macalé ou com grupos de passarinheiros. As defesas dos dois negam que os encontros com Lessa e Macalé tenham ocorrido.
A atuação de Macalé permanece como peça-chave no quebra-cabeça que tenta esclarecer quem mandou matar Marielle Franco e Anderson Gomes. O manuseio do celular após a sua morte adiciona mais um ponto de interrogação ao caso.
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