Para além das comemorações, os números do emprego divulgados pelo Caged 1 escondem dura realidade.
Assim, é preciso lançar olhar para além dos números e desvendar ou enxergar o que esses não revelam numa visão meramente superficial. O Brasil encerra mais um ciclo com aumento no emprego formal, segundo o Caged.
Em qualquer economia emergente, esse seria dado inequívoco de avanço. Mas não é bem assim.
Vamos explorar melhor esses dados, em perspectiva crítica. Aqui, porém, esse é acompanhado de fator que impede comemoração plena: a renda média dos trabalhadores permanece em apenas R$ 2.304, o equivalente a 1,52 salário mínimo.
Economistas como Monica de Bolle (Peterson Institute) e Laura Carvalho (USP) têm insistido há anos na mesma tecla: crescimento baseado apenas em ocupação, sem aumento de renda e produtividade, produz expansão frágil e insustentável.
E é exatamente isso que os dados brasileiros revelam: economia que emprega, mas não emancipa.
RENDA ESTAGNADA: PROBLEMA ESTRUTURAL
O Banco Mundial e a OCDE destacam repetidamente que o Brasil é um dos países com maior desalinhamento entre produtividade e remuneração. Enquanto a produtividade brasileira cresce em ritmo lento há quase 4 décadas, os salários se arrastam ainda mais. Relatórios recentes desses organismos mostram que:
A renda real dos trabalhadores brasileiros estagnou ao longo dos últimos 10 anos;
O Brasil tem um dos piores índices de mobilidade social da América Latina; e
Setores de baixo valor agregado concentram a maior parte da mão de obra formal.
R$ 2.304 não cobre o custo de vida básico em grandes centros urbanos, e mesmo em cidades médias a renda é tragada por aluguel, energia e alimentação; itens que puxaram a inflação estrutural nos últimos anos, como destacam boletins do Ipea.
O resultado é paradoxo cruel: o trabalhador está empregado, mas continua pobre.
A formalização, embora bem-vinda, não garante dignidade econômica.
JUROS DE 15%: A ECONOMIA NÃO SUPORTA
A taxa básica de juros (Selic) na casa dos 15% coloca o Brasil na contramão do mundo.
Enquanto Estados Unidos, Europa e países latino-americanos reduzem juros para proteger consumo e investimento, o Brasil segue com política monetária restritiva, regressiva e extorsiva.
Segundo o FMI, juros elevados por longos períodos reduzem o potencial de crescimento, desestimulam inovação e penalizam pequenas e médias empresas, motores de qualquer economia emergente.
Os efeitos são claros: Crédito caro – famílias desistem de financiar bens duráveis; PME (Pequenas e Médias Empresas) paralisadas – empresários deixam de investir, contratar e expandir; Menor consumo interno – principal variável que explica 60% do PIB brasileiro; e Economia patina – alimentando círculo vicioso de baixo crescimento.
O economista André Lara Resende, ex-diretor do Banco Central, resume a situação: “Juros tão altos por tanto tempo não controlam inflação — controlam crescimento e oportunidades.” CRESCIMENTO QUE NÃO DISTRIBUI Ipsos, Cepal e OCDE têm reiterado que o Brasil vive armadilha: cresce pouco porque produz pouco; produz pouco porque paga mal; paga mal porque não investe em inovação nem tampouco em qualificação. E a política monetária atual exacerba esse quadro.
A geração de empregos é passo importante, mas insuficiente. Sem salário digno, o País não cria mercado consumidor robusto, condição fundamental para qualquer ciclo de desenvolvimento sustentado.
BRASIL PRECISA ESCOLHER ENTRE PRESENTE E FUTURO
O cenário exige escolhas estratégicas:
Política de renda que reduza a defasagem salarial;
Aceleração da produtividade, via educação, inovação e crédito barato;
Reformas que reduzam o custo Brasil;
Sobretudo, juros compatíveis com a realidade produtiva, não apenas com a ortodoxia financeira. Gerar vagas é positivo.
Gerar renda é transformador. São necessárias ambas.
Enquanto essa transformação não ocorrer, o Brasil seguirá comemorando empregos que mantêm milhões no mesmo lugar: empregados, mas ainda pobres.
Com a imensa maioria pobre, o Brasil segue também pobre, embora seja rico, porque a renda está concentrada.
E assim não distribui riqueza.
Trata-se de ciclo vicioso e não do ciclo virtuoso, porque clama o povo brasileiro.
(*) Jornalista, analista político, assessor parlamentar do Diap e redator do Jornal Hora do Povo


