Após a eleição, antes de assumir pela terceira vez, sem meias palavras Lula afirmou que a prioridade maior do governo seria “incluir o povo no orçamento”, e que não aceitaria atrelar o orçamento público do país à dívida pública e submeter os interesses maiores dos brasileiros aos desejos, principalmente, dos especuladores do mercado financeiro. Um posicionamento que despertou esperança, visto que incluir o povo no orçamento significaria mudança de prioridade na utilização dos recursos públicos, que atualmente são expropriados por uma taxa de juro absurda e canalizados para propiciar privilégios à elite econômica.
A vontade política de Lula, porém, não prevaleceu. Envolvido pelo canto da sereia do ministro Fernando Haddad, Lula acreditou na falácia do “Arcabouço Fiscal”, cuja essência representa a continuidade da ancoragem do orçamento aos interesses dos tubarões da economia, que se fartam às custas do dinheiro público, enquanto o povo e sociedade em geral padece em consequência do sucateamento das políticas públicas e falta de recursos para investimento no desenvolvimento econômico que permita a prosperidade econômica às empresas, elevar a renda da classe média e salários dos trabalhadores. Enfim, desenvolvimento econômico e bem-estar social. Resumindo: Haddad convenceu Lula a transformar o seu governo em “mais do mesmo”, e o resultado não poderia ser outro se não o “distanciamento” do povo.
Interesses conflitantes fazem parte da natureza da sociedade, e governar exige escolher lado. Assim, não se trata apenas de equívoco de caráter estratégico e tático, mas da essência política do malfadado “Arcabouço Fiscal” do ministro Fernando Haddad, que continuou privilegiar os bancos e magnatas, em detrimento do povo. Ademais, não adianta governar se submetendo a uma minoria e fazer discurso sobre um pseudo compromisso com a maioria, que o resultado mais provável é o isolamento.
Outro aspecto crucial, que pesa em muito, consiste na passividade do governo diante de medidas e manobras para esvaziar o poder político e entregar o domínio paralelo de setores altamente estratégicos para a elite econômica e monopolista.
Primeiramente, o Banco Central, responsável pela política cambial e taxa de juro, foi criminosamente entregue ao capital financeiro por Bolsonaro e ex- ministro Paulo Guedes. Trocando em miúdos, no Brasil entregaram o galinheiro para a raposa [bancos e especuladores], todavia Lula não retornou o controle. O estrago é grande, como citamos. Apenas no exercício financeiro de 2024, de um déficit público total de R$ 998 bilhões, o setor público, composto pela União, estatais, estados e municípios, foi responsável pelo gasto de R$ 47,6 bilhões, o que significa que os juros representaram R$ 950,4 bilhões para os cofres do capital financeiro.
A Eletrobras, que opera na área estratégica de produção e distribuição de energia elétrica, essencial para as famílias, empresas e desenvolvimento econômico e social, também foi privatizada por Bolsonaro e o Lula não retomou o comando. Atualmente, o custo oneroso da energia elétrica, devido à ausência do papel regulador da Eletrobras, é carro chefe da inflação, um dos fatores que atrasa o desenvolvimento e desmoraliza o governo Lula.
Em relação à Petrobras cabe reconhecer os problemas causados pela privatização das refinadoras e distribuidoras, também no governo de Bolsonaro. Porém, a Petrobrás formalmente é uma empresa estatal, mas quem determina os rumos são os abutres do grande capital internacional, detentores de ações da empresa, que cotam os preços dos combustíveis visando lucros estratosféricos, e o governo não toma as rédeas da situação. Para completar, o governo reduz os custos dos combustíveis, mas as distribuidoras e postos não respeitam e não repassam as reduções para os preços ao consumidor.
Então, formou-se uma espécie de governança paralela, que exige firmeza do governo para impor a autoridade que lhe conferiu os 62 milhões de votos dos brasileiros. Caso contrário, a autocritica se limitará a meras palavras, e governar, além de coragem para defender o povo, exige decisões firmes e atitudes enérgicas.
Na edição de 4ª feira (22/10) a parte III, final deste artigo