Com previsões meteorológicas favoráveis, a primeira estimativa da Conab, estatal do Ministério da Agricultura, aponta alta de 1% na produção de grãos na safra 2025/2026, com novo recorde. Por outro lado, o quadro de cotações em queda e insumos e juros em alta (mesmo com os subsídios do governo), que comprime as margens desde a safra 2023/2024 e levou a desequilíbrios financeiros no setor nos últimos anos, pode se agravar agora.
O Rabobank, banco holandês especializado em crédito agrícola, prevê queda na margem operacional média do produtor de soja no Brasil para 24% em 2026, ante 38% neste ano. Em parte, por causa dos aumentos de 20% no custo de fertilizantes (para melhorar a nutrição do solo e das plantas) e de 14% nos gastos com defensivos agrícolas (para prevenir pragas). Algo semelhante ocorre na produção de milho.
Um mapeamento da consultoria Datagro apontou queda na lucratividade bruta de três de cinco regiões de produção de soja pesquisadas. Em quatro anos, as margens de lucro dos produtores de soja caíram à metade, estima outro estudo, da Serasa Experian.
“Meses atrás, o Imea (Instituto Mato-Grossense de Economia Agropecuária) tinha cálculos que, considerando só a cultura da soja, o produtor que pagava arrendamento (que planta em terras de terceiros e paga aluguel por isso) tinha um prejuízo médio de R$ 600 por hectare”, conta Lucas Costa Beber, que tem fazendas na região de Nova Mutum (MT) e é presidente da Aprosoja-MT, associação dos sojicultores.
VENDAS DE PROPRIEDADES
Dificilmente as margens melhorarão pelo lado dos preços internacionais, porque há poucos sinais de mudança nos próximos 18 meses, diz Lucilio Alves, professor da Esalq, a escola agrícola da USP. Isso porque os níveis de estoques globais de commodities agrícolas estão relativamente bons diante da demanda, com a economia global vivendo as incertezas da guerra comercial de Donald Trump nos EUA.
No mesmo relatório, divulgado neste mês, em que projeta a queda nas margens para a safra 2025/2026, o Rabobank estima que o quadro só melhorará em 2027. Segundo o analista Bruno Fonseca, autor do trabalho, é hora de o produtor fazer “o básico”: cuidar dos custos, tentar gerar caixa com vendas de propriedades, tentar alongar a dívida, se desfazer de bens das fazendas.
Colocar a casa em ordem é importante por causa de outro componente dos custos: o pagamento de dívidas. Esse item encareceu com o aumento recente dos juros. Os efeitos são ainda mais negativos porque os produtores rurais estão muito endividados, diz o economista-chefe da consultoria MB Associados, Sérgio Vale.
CALOTES AFETAM BANCOS
Os desequilíbrios financeiros levaram a aumentos na inadimplência dos produtores rurais e no número de pedidos de recuperação judicial no setor, mostram dados da Serasa Experian.
No primeiro trimestre, 7,9% de um total de quase 10 milhões de produtores pessoas físicas acompanhados pela consultoria de dados tinham dívidas com mais de 180 dias de atraso. Nos três primeiros meses de 2024, eram 7%. Já as recuperações judiciais, tanto de pessoas físicas quanto de empresas agrícolas, somaram 389 requisições no primeiro trimestre, alta de 21,5% ante os três últimos meses de 2024. Ano passado, foram 975 pedidos de recuperação, mais que o triplo do registrado em 2023.
A inadimplência no crédito rural tem marcado os balanços financeiros dos últimos trimestres dos bancos federais, como Banco do Brasil (principal operador do Plano Safra), Caixa, Banco do Nordeste (BNB) e do Banco da Amazônia (Basa).